O debate sobre os sinistros de trânsito costuma se concentrar nas mortes. E é natural que seja assim. Cada vida perdida representa uma ausência irreparável. São famílias partidas ao meio, sonhos interrompidos e uma saudade que não cabe no peito. A Fundação Thiago Gonzaga existe por causa disso. Nasceu da dor de uma perda no trânsito e transformou essa dor em ação. Ao longo de quase 30 anos, tem lutado para que nenhuma família passe por essa experiência.
Mas há um aspecto que raramente ganha espaço nas discussões sobre segurança viária: o impacto econômico que os sinistros geram mesmo quando não resultam em morte. Quando alguém sobrevive, mas precisa ser internado, passar por cirurgias, usar leitos e recursos hospitalares por semanas ou meses, o custo não desaparece. Ele apenas muda de forma.
Segundo levantamento recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, com base em dados do Datasus, o Sistema Único de Saúde gastou R$ 449 milhões em 2024 com atendimentos a vítimas de trânsito. Só o Rio Grande do Sul foi responsável por mais de R$ 11 milhões desse total. São valores públicos, sustentados por todos, que poderiam ser direcionados a outras áreas se o número de sinistros fosse menor.
A Organização Pan-Americana da Saúde estima que, nos países da América Latina, os sinistros consomem entre 1% e 3% do Produto Interno Bruto. No Brasil, isso representa entre R$ 117 bilhões e R$ 351 bilhões por ano, considerando o PIB de 2024. É uma faixa que revela a gravidade do problema. Não se trata de um fenômeno individual, mas de um peso coletivo que recai sobre a saúde, a economia e o cotidiano da população.
O trânsito inseguro tem múltiplas consequências. Ele tira vidas, mas também compromete o funcionamento do sistema de saúde, a produtividade das pessoas, o orçamento das famílias e a capacidade do Estado de investir onde é mais necessário. E o mais difícil de aceitar é que grande parte disso poderia ser evitada.
Com políticas públicas consistentes, ações permanentes de educação para o trânsito, fiscalização qualificada e investimento em transporte público de qualidade, esse cenário pode mudar. O custo da omissão é alto. E é injusto. Continuar tratando sinistros como acidentes, eventos isolados e imprevisíveis, apenas perpetua a lógica de que nada pode ser feito.
Prevenir é uma atitude responsável. Cada sinistro evitado significa uma vida protegida, uma família preservada e menos pressão sobre os serviços públicos. No trânsito, é possível agir antes. O Brasil tem adiado essa decisão todos os dias. E o custo aparece nos números, nos leitos ocupados, nos registros de acidentes e nas perdas que se repetem. Já passou da hora de mudar esse cenário.
